Antes mesmo da autorização formal, entidade já havia sido convidada. Auditoria da SMADS terá coragem de apurar os atos da atual coordenadora da GSUAS?
No funcionamento ideal da administração pública, uma nova parceria para implantação de um serviço deve obedecer a um fluxo mínimo de legalidade. Primeiro, a necessidade deve ser constatada tecnicamente pela Supervisão de Assistência Social local. Depois, é preciso obter a autorização da Coordenadoria de Gestão do SUAS (GSUAS) e, por fim, realizar um chamamento público. Em casos excepcionais, pode-se recorrer à figura da parceria emergencial desde que motivada por situação de grave e iminente necessidade, e que a entidade convidada tenha condições de execução imediata.
Nada disso foi seguido no caso da ILPI "Arte de Viver", planejada para funcionar na Rua Doutor Lopes de Almeida, nº 165, Vila Mariana, com capacidade para acolher 30 pessoas idosas.
O Fórum da Assistência Social teve acesso ao processo completo e analisou documentos oficiais que revelam uma sequência de irregularidades que envolvem datas incompatíveis, ausência de execução e pagamentos vultosos com dinheiro público.
Tudo começa de forma torta: a organização Centro de Capacitação para a Vida – Projeto Neemias recebeu um convite formal da SMADS para assumir a parceria em 29 de novembro de 2022. Contudo, o pedido para celebrar essa parceria só foi formalizado quase um mês depois, em 21 de dezembro, pela então Supervisora de Assistência Social da Vila Mariana, Egle Maria Ruiz Moura (guardem esse nome voltaremos a falar no futuro sobre essa servidora). No mesmo dia, a então coordenadora da GSUAS, Regina Alves Ribeiro, autorizou a celebração da parceria em caráter emergencial.
![]() |
Pedido de abertura do emergencial direcionada a Regina Alves ribeiro e autorizado pela mesma com sua assinatura e carimbo datado do dia 21.12.2023 |
Ou seja, a entidade foi escolhida quase um mês antes de haver qualquer autorização ou existência formal do serviço. O convite foi feito antes mesmo da manifestação técnica, da justificativa e da autorização de abertura da parceria. A cronologia por si só demonstra um direcionamento completamente incompatível com os princípios da legalidade e da impessoalidade no serviço público.
![]() |
Data em que a OSC foi convida a assumir a parceria um mês antes de existir a ordem de iniciar o processo de escolha . Ou mesmo da existência formal do processo emergencial |
O Termo de Colaboração nº 244/SMADS/2023, que formalizou a parceria, só foi assinado em 14 de junho de 2023 com vigência retroativa a 19 de dezembro de 2022, e encerramento dois dias depois: 16 de junho de 2023.
![]() |
Data da vigência da parceria firmada |
![]() |
Data que foi assinado o termo de colaboracao |
De fato, o repasse foi feito em 21 de junho de 2023, cinco dias após o fim da vigência legal do contrato. Pagou-se retroativamente cinco meses de aluguel R$ 200.000,00 mesmo sem nenhuma execução comprovada do serviço.
E quanto ao prédio que foi alugado e pago... quem articulou ?
![]() |
Uma das PLs de pagamento que encontramos no processo prova que houve liberação de recursos mesmo o serviço nunca entrando em operação. |
A própria SMADS reconhece o problema: pareceres financeiros oficiais apontam que mais de R$ 471 mil deverão ser devolvidos aos cofres públicos.
E não termina aí. Após o encerramento dessa parceria emergencial, foi finalmente aberto um edital de chamamento público para continuidade do serviço. Mas o edital foi impugnado judicialmente por meio de mandado de segurança, e o processo segue paralisado. Essa parte da história será contada em detalhes em uma próxima publicação.
Porque se fôssemos detalhar tudo o que envolveu esse único caso da Vila Mariana do convite antecipado ao impasse jurídico não caberia em uma única matéria.
E esse não é um caso isolado. O Fórum da Assistência Social tem identificado diversos serviços celebrados em formato semelhante, com dispensa de chamamento, cronologia suspeita e execução inexistente, todos com a assinatura da então coordenadora da GSUAS, Regina Alves Ribeiro. Vale lembrar: Regina voltou ao mesmo cargo em 2025, agora nomeada pela secretária Eliana Maria das Dores Gomes a mesma que instaurou uma auditoria com o discurso forte de moralização.
A pergunta que não quer calar: essa auditoria interna vai mesmo investigar os atos da própria cúpula técnica da SMADS?
Há quem veja escândalo em outras regiões, como a Casa Verde em épocas recentes . Mas quem conhece o cotidiano da SAS Vila Mariana sabe que ali as relações políticas e os favorecimentos de bastidores atingiram outro nível. A atual supervisora, por exemplo, ex-gerente da CEBASP, teria sido alçada ao cargo por conta de sua proximidade com duas figuras centrais da SMADS, cujos nomes o leitor já pode intuir com facilidade. E se tudo isso já causa perplexidade, imagine o que mais pode haver nos porões da burocracia que ainda não veio à tona.
Esta é a segunda matéria da série, baseada em documentos públicos, assinaturas oficiais e pareceres da própria administração. E outras virão. Porque se é para apurar, que se apure tudo. Sem exceções.
Nota de encerramento:
Tudo o que foi aqui relatado não se trata de conjectura ou suposição, mas de fatos extraídos de documentos públicos, disponíveis no processo SEI nº 6024.2022/0011125-2, acessível por qualquer cidadão. Os elementos apresentados demonstram de forma clara e objetiva a sequência de atos administrativos que resultaram em uma parceria firmada, um contrato de aluguel milionário e a não implantação do serviço contratado.
Ainda assim, o Fórum da Assistência Social da Cidade de São Paulo, por meio de seus canais institucionais, permanece à disposição de todas as pessoas mencionadas nesta matéria, caso queiram se manifestar ou apresentar esclarecimentos.
Nota do Fórum:
Muito nos causa estranheza a postura atual da senhora Regina Alves Ribeiro, que em conversas informais e bastidores alega não ter tido autonomia para nada no período em que ocupou a Coordenação de Gestão do SUAS. Se apresenta como uma simples técnica obediente, como quem apenas “cumpre ordens”.
Esse discurso, porém, não combina em nada com o comportamento imperativo e, muitas vezes, autoritário que ela adota na prática.
Não é essa a Regina que troca Analistas de Políticas Públicas e Gestão Governamental (APPGG) de função por puro capricho, que impõe decisões de forma unilateral nas reuniões com as organizações e que defende com veemência a transferência de servidores ex officio?
Hoje, na gestão da doutora Eliana Gomes, é preciso reconhecer: os fatos aqui narrados não teriam ocorrido. A secretária atual é conhecida por acompanhar pessoalmente cada decisão relevante, e nenhuma autorização sai sem seu conhecimento direto.
Mas em 2022 e 2023, sob outra lógica de comando, a GSUAS operava com um poder quase irrestrito talvez nunca antes visto na história recente da SMADS.
O resultado está aí: contratos mal explicados, cronologias sem lógica, serviços fantasmas e parcerias que deixaram um rastro de desperdício.
17/02/2025
24/03/2025
07/04/2025
19/05/2025- PRÓXIMA PLENÁRIA
09/06/2025
0 comments:
Postar um comentário
Muito obrigado pelo seu comentario